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Crescem crimes de ódio racial em Portugal

A Comissão para a Cidadania e a Igualdade de Género (CIG) nunca recebeu tantas queixas de discriminação como nos últimos dois anos e a Associação Portuguesa de Apoio à Vítima (APAV) bateu recordes de pedidos de apoio para situações de discriminação e incitamento ao ódio e à violência, sendo “a nacionalidade brasileira a mais discriminada”, revela um artigo publicado hoje, segunda-feira, dia 15, no “Jornal de Notícias”, editado na cidade do Porto. No ano passado, o Ministério Público português instaurou 262 inquéritos por crimes de ódio, números que aumentam desde 2019.

Segundo as autoridades, este tipo de criminalidade cresceu 38% em 2023, com 347 delitos naquele ano. A associação SOS Racismo alerta também para a subida do número de mortes.

Ao “Jornal de Notícias”, o brasileiro Bruno Andrade, a viver em Portugal há uma década, revela que comentários como “Volta para a tua terra”, “macaco” ou “favelado” são os que mais lê na sua página da rede social X e que os mesmo têm aumentado. O jornalista e comentador de futebol conta que nunca foi alvo de tantas observações xenófobas como nos últimos dois anos. “Sempre fui ameaçado, mas antes recebia mensagens privadas, agora são ataques públicos. As pessoas perderam a vergonha de serem xenófobas e racistas”. Admite que já se sentiu mais seguro cá e pondera voltar a viver no Brasil. O brasileiro de dupla nacionalidade equacionou apresentar queixa, mas nunca o fez por entender que é uma “perda de tempo”.

Ódio destilado na Internet

A gestora da Rede de Apoio à Vítima Migrante e de Discriminação da APAV, Joana Menezes, indica que, entre as situações reportadas, “a nacionalidade brasileira é a mais frequentemente discriminada”.

Em 2023, a associação registou 13 contraordenações relacionadas com discriminação e 11 situações de crimes raciais, sendo “a nacionalidade o fator que mais frequentemente está na base da discriminação, seguindo-se situações relacionadas com a cor da pele”. As queixas prendem-se, sobretudo, com o impedimento da fruição de serviços, acesso ao emprego ou aos cuida dos de saúde, discriminação no exercício das funções ou a recusa de venda ou arrendamento de imóveis.

“É frequente ouvirem, de forma muito clara, que não se alugam casas a estrangeiros ou a brasileiros. Tivemos uma situação de um casal homossexual e brasileiro que sentiu discriminação na visita a uma casa pelo agente imobiliário”, exemplifica Joana Menezes ao “Jornal Notícias”.

A APAV bateu recordes nos pedidos de apoio relacionados com situações de discriminação e incitamento ao ódio e à violência, com 241, 394 e 210 denúncias em 2020, 2021 e 2022, respetivamente. “Os números dispararam entre 2019 (17) e 2020 (241), porque passámos a ter a Linha Internet Segura, que recebe denúncias de conteúdos racistas, homofóbicos e xenófobos encontrados na Internet”, explica a responsável.

Também a CIG soma cada vez mais queixas de discriminação. Em 2022, foram reportadas 95 situações e, no ano seguinte, 70. As mais representativas são por discriminação em razão do sexo e género (45 em 2022 e 39 em 2023). Já o Ministério Público instaurou 865 inquéritos nos últimos cinco anos, com uma tendência crescente. O ódio é o fundamento-base de todos os processos. Os dados são comparáveis até 2022, porque, a partir daquele ano, os números do Ministério Público passaram a incluir “mais realidades relacionadas com este fenómeno”. A PSP e a GNR registaram 347 crimes de discriminação e incitamento ao ódio em 2023, mais 77 casos do que em 2022. O dirigente da SOS Racismo, Nuno Silva, alerta que, “nos últimos cinco anos, há mais agressividade” e “aumentou, exponencialmente, o número de mortes”.

Tereza Pizarro Beleza, coordenadora do Observatório do Racismo e Xenofobia, citada pelo “Jornal Notícias” acredita que “os chamados crimes de ódio poderão multiplicar-se, se um sentimento de impunidade se associar ao avanço de partidos políticos e movimentos de extrema-direita de cariz racista e xenófobo, fazendo vir ao de cima preconceitos que estavam mais escondidos” na nossa sociedade.

106 denúncias

A SOS Racismo recebeu 106 denúncias de discriminação com base na nacionalidade, etnia e cor da pele em 2023. Os agentes de discriminação foram, maioritariamente, pessoas que vivem na comunidade (47,1%), como vizinhos, e a Polícia (17,2%).

Casos de racismo

Este ano, já houve casos mediáticos de racismo. Em Fevereiro, um jogador do Famalicão foi alvo de insultos racistas por um adepto do Farense. Em Março, um homem cabo-verdiano foi agredido alegadamente por motivos raciais, no Faial, acabando por morrer.

262 Inquéritos relativos a crimes com a agravante “ódio’’ instaurados em 2023 pelo MP, recorde dos últimos cinco anos.

491 queixas à Comissão para a Igualdade e contra a Discriminação Racial em 2022. Mais 40 por mês do que em 2021.

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