Primeiro discurso do Papa em Lisboa marcado por elogios e críticas
Foi um discurso prenhe de desafios aquele que o Papa Francisco proferiu na sua primeira intervenção em Portugal, no anfiteatro lotado – mais de 600 pessoas, entre muitas personalidades de todas as áreas – do Centro Cultural de Belém (CCB), em Lisboa, ao final da manhã de quarta-feira.
“Estou feliz por estar em Lisboa, cidade do encontro que abraça vários povos e culturas e que, nestes dias, se mostra ainda mais universal; torna-se, de certo modo, a capital do mundo. Isto condiz bem com o seu caráter multiétnico e multicultural (penso, por exemplo, no bairro da Mouraria, onde convivem pessoas provenientes de mais de sessenta países) e revela os traços cosmopolitas de Portugal, que afunda as suas raízes no desejo de se abrir ao mundo e explorá-lo, navegando rumo a novos e amplos horizontes”, começou de referir Francisco.
Num discurso eloquente, mas directo, o Papa lembrou o papel da Velha Europa – emendou para Antiga Europa – no mundo. “O mundo tem necessidade da Europa, da Europa verdadeira: precisa do seu papel de construtora de pontes e de pacificadora no Leste europeu, no Mediterrâneo, na África e no Médio Oriente. Assim poderá a Europa trazer, para o cenário internacional, a sua originalidade específica.” Não deixou de lembrar o momento tempestuoso “de falta de rotas corajosas de paz”, mostrando-se preocupado “com o empobrecimento do capital humano”, ou seja, “a educação, a saúde, o Estado Social.” E acrescentou: “Fica-se preocupado ao ler que, em muitos lugares, se investem continuamente os recursos em armas e não no futuro dos filhos. Investe-se mais nas fábricas de armas do que no futuro dos filhos.”
Mais adiante criticou “o descarte dos idosos, os muros de arame farpado, as mortandades no mar e os berços vazios.” “Para onde ides se, perante o tormento de viver, vos limitais a oferecer remédios rápidos e errados como o fácil acesso à morte, solução cómoda que parece doce, mas na realidade é mais amarga que as águas do mar? Penso em tantas leis sofisticadas sobre a eutanásia…”
Focou ainda o Ambiente, um problema global. “Os oceanos aquecem e, das suas profundezas, sobe à superfície a torpeza com que poluímos a nossa casa comum. Estamos a transformar as grandes reservas de vida em lixeiras de plástico. O oceano lembra-nos que a existência humana é chamada a viver de harmonia com um ambiente maior do que nós; este deve ser guardado com cuidado, tendo em conta as gerações mais novas. Como podemos dizer que acreditamos nos jovens, se não lhes dermos um espaço sadio para construir o seu futuro?”
No final, agradeceu e encorajou a tantos que na sociedade se preocupam com os outros, nomeadamente a Igreja, e que fazem tanto bem mesmo longe dos holofotes. “Sintamo-nos chamados, todos juntos fraternalmente, a dar esperança ao mundo em que vivemos e a este magnífico país.”