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Angola condena atrocidades contra civis no Leste da RDC

Angola condenou, segunda-feira, de forma veemente, as atrocidades cometidas contra as populações civis no Leste da República Democrática do Congo (RDC), em particular nas províncias do Kivu Norte e Sul, com realce para a tomada de Uvira pelos rebeldes do M23 com o apoio do Rwanda, após a assinatura dos acordos de paz em Washington.

O repúdio do país foi expresso pelo ministro das Relações Exteriores, Téte António, quando discursava, por videoconferência, na 1321.ª reunião do Conselho de Paz e Segurança da União Africana sobre a situação no Leste da RDC.
Téte António afirmou que os relatos de assassinatos, deslocações forçadas, violência sexual baseada no género e o recrutamento de crianças-soldado representam graves violações dos direitos humanos e constituem uma ameaça intolerável à paz e à dignidade da pessoa humana na região.
“Angola denuncia, desta feita, a escalada de violência que culminou, nos últimos meses e semanas, com a tomada de posições e cidades estratégicas pelo grupo AFC/M23, enfraquecendo de forma significativa as autoridades legítimas congolesas e as suas Forças Armadas”, disse o chefe da diplomacia angolana.
Face à situação prevalecente, continuou Téte António, Angola reafirma a sua posição firme em defesa da soberania da RDC e da protecção das populações civis, apelando ao fim imediato das hostilidades e ao respeito pelos princípios fundamentais do Direito Internacional.
O ministro angolano lamentou, ainda, a continuidade do conflito armado, apesar das diversas iniciativas regionais e continentais, no âmbito da Conferência Internacional sobre a Região dos Grandes Lagos, da Comunidade de Desenvolvimento da África Austral e da Comunidade da África Oriental, assim como dos esforços de mediação conduzidos pela União Africana.
As tentativas de resolução do conflito, disse Téte António, reforçadas por intervenções internacionais, incluindo dos Estados Unidos da América e do Estado do Qatar, não têm conseguido travar a escalada da violência nem garantir a segurança das populações afectadas.
“O quadro alarmante da situação de conflito vigente impõe-nos um exercício de franqueza diplomática, capaz de reconhecer que não é a inexistência de acordos que prolonga a guerra, mas sim a falta de vontade política para os aplicar com seriedade”, acrescentou.
Para o chefe da diplomacia angolana, é convicção de Angola que a paz não se alcança apenas pela formalidade das assinaturas de instrumentos jurídicos, mas pela coragem política, “pela transparência e pela responsabilidade de transformar compromissos em realidade”.
O verdadeiro desafio, sublinhou o ministro das Relações Exteriores, reside em garantir que os acordos assumidos sejam implementados de forma integral e verificável, traduzindo-se em acções concretas que respondam às necessidades das populações e consolide a estabilidade.
“Trata-se da crise que já não pode ser considerada episódica, mas sim estrutural e prolongada, com implicações directas para toda a região dos Grandes Lagos e para a segurança continental”, admitiu Téte António, salientando que Angola tem acompanhado com profunda preocupação a evolução da situação no Leste da RDC.
A falta de uma determinação política sincera, aliada à multiplicação de processos paralelos sem compromissos vinculativos e sem mecanismos de responsabilização efectiva, referiu, tem vindo a fragilizar a credibilidade colectiva.
Esta realidade, acrescentou Téte António, não só compromete os esforços regionais e internacionais, mas mina a confiança necessária para a construção de soluções duradouras e sustentáveis e prolonga o sofrimento humano nesta região do continente africano.
“O prolongamento do conflito no Leste da RDC tem produzido efeitos devastadores sobre a vida das populações, com milhões de deslocados internos e refugiados, níveis alarmantes de insegurança alimentar, colapso dos sistemas de saúde e educação e uma juventude privada de esperança, empurrada para ciclos de violência e exclusão”, constatou.
Agravamento das condições humanitárias
As consequências humanitárias, de acordo com o ministro angolano, agravam o sofrimento imediato e comprometem o futuro da região, onde a instabilidade também afecta o funcionamento normal dos corredores económicos estratégicos, prejudica os esforços de integração africana e enfraquece a confiança entre os Estados vizinhos.
“Ao mesmo tempo, abre caminho à proliferação do terrorismo violento e da criminalidade organizada transnacional, entre outras ameaças assimétricas”, lamentou.
Téte António considera, por isso, a situação de extrema gravidade, tendo destacado um aspecto que permanece “insuficientemente enfrentado”, designadamente “a perigosa tendência da comunidade internacional em normalizar gradualmente a tragédia no Leste da RDC, sendo que a repetição constante da violência corre o risco de gerar indiferença estratégica entre os Estados”.
O ministro afirmou, ainda, que não se pode aceitar que o Leste da RDC se converta numa zona onde o conflito é apenas administrado e não resolvido, nem que a guerra se cristalize como um estado permanente legitimado pela inacção global.
“Nós, enquanto República de Angola, gostaríamos de recordar aos actores directamente envolvidos, bem como aos seus apoiantes devidamente identificados, que o sofrimento das populações do Leste da RDC não é abstrato de todo”, asseverou Téte António, para quem as mulheres, crianças e homens, no local, também gozam do direito inalienável à vida, à dignidade e à paz.
“Verificamos que os princípios fundadores da Carta das Nações Unidas e do Acto Constitutivo da União Africana, nomeadamente o respeito pela soberania, integridade territorial, não ingerência e protecção das populações civis, estão a ser flagrantemente violados”, denunciou.
O chefe da diplomacia angolana lembrou que “a história não será indulgente com quem, por acção ou omissão, contribui para esta tragédia (no Leste da RDC”, reiterando o apelo firme de Angola à consciência de todos, para que se respeitem os princípios acordados, se implementem os compromissos assumidos e se privilegie o diálogo sincero e inclusivo, em detrimento da prevalência da lógica das armas, “que muitas vezes encobre agendas ocultas”.
 País propõe adopção de Declaração Continental contra grupos armados
Angola propôs ao Conselho de Paz e Segurança da União Africana, como condição prioritária dos Estados-membros da União Africana, a adopção de uma Declaração Continental contra a instrumentalização de grupos armados, como ferramentas de política externa, acompanhada de um compromisso verificável por parte dos Estados.
A proposta consta das recomendações adicionais sugeridas por Angola, durante a sessão ministerial, alinhadas às considerações constantes do ´briefing´ sobre a crise no Leste da RDC.
De acordo com o ministro das Relações Exteriores, considera-se imperativo consolidar a operacionalização dos mecanismos africanos existentes de prevenção, gestão e resolução de conflitos, no sentido de permitir o reforço funcional do Sistema Continental de Alerta Precoce e garantir a ligação directa entre a análise de risco, a tomada de decisão política e a acção preventiva concreta do Conselho de Paz e Segurança.
De igual modo, urge a necessidade de rever a Arquitectura de Paz e Segurança Africana (APSA) para reforçar o papel central do Conselho de Paz e Segurança como instância política suprema de direcção estratégica em matéria de respostas africanas aos conflitos, nomeadamente aumentando a capacidade africana de financiamento da paz, o que diminuirá a dependência excessiva de parceiros externos e garantirá uma maior autonomia política às decisões africanas.
Téte António referiu, também, que se impõe a necessidade obrigatória da implementação rigorosa das cláusulas constantes dos Acordos recentemente assinados em Washington, Estados Unidos da América, pelo Presidente Paul Kagame e Félix Antoine Tshisekedi Tshilombo, bem como dos instrumentos regionais e continentais já existentes e garantir o acompanhamento efectivo dos processos de cessar-fogo e de Desarmamento, Desmobilização e Reintegração.
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