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Israel divide cimeira da União Africana

A cena, acalorada, ensombrou de certa forma o início dos trabalhos cimeira da União Africana (UA), na manhã de sábado, 18 de Fevereiro, quando um representante do Ministério dos Negócios Estrangeiros israelita foi expulso da sala onde decorria a Assembleia Geral da UA, em Adis Abeba, Etiópia.

O vídeo postado nas redes sociais mostra Sharon Bar-li, a vice-directora geral do Ministério dos Negócios Estrangeiros israelita para África, a ser conduzida para fora da sessão plenária por agentes de segurança da instituição continental. Israel acusou rapidamente o Irão de estar por detrás desta “grave” expulsão, lamentando na mesma declaração que “a União Africana esteja a ser mantida refém por um pequeno número de países extremistas, como a Argélia e a África do Sul.”

De acordo com vários diplomatas presentes em Adis Abeba, a delegação argelina ameaçou abandonar a cimeira se os representantes israelitas permanecessem no hemiciclo. Numa tentativa amenizar o incidente, a UA reivindicou um problema protocolar. Ebba Kalondo, porta-voz da Comissão da UA, que actua como secretariado da organização, disse à France Press que uma pessoa tinha sido “convidada a sair” porque não tinha sido convidada para a reunião.

Estatuto de observador

Este caso não deixa de ser um revés para Israel, uma vez que a normalização das suas relações com os Estados africanos é uma das prioridades do governo do primeiro-ministro Benyamin Netanyahu. Nos últimos anos, os diplomatas israelitas têm vindo a percorrer as capitais africanas em busca de reconhecimento. Ainda no início de Fevereiro o Ministro dos Negócios Estrangeiros, Eli Cohen, esteve no Sudão para estreitar laços calorosos com Cartum. Dos 54 países africanos, 46 reconhecem actualmente o Estado judaico.

 

Em Julho de 2021, o presidente da Comissão, Moussa Faki Mahamat, tinha concedido a Israel o estatuto de observador junto da organização. Mas a presença de Telavive continua a ser uma das principais fontes de controvérsia no seio da instituição. A acreditação criou uma tal divisão que o debate sobre o estatuto de observador do Estado judaico foi adiado durante a cimeira de 2022.

À comissão criada para o efeito foi dado ano para examinar esta espinhosa questão, mas nunca se reuniu. Esta é só mais uma demonstração da incapacidade da União Africana em resolver disputas entre países”, observa Paul-Simon Handy, um investigador do Instituto de Estudos de Segurança. Sobre esta questão, a UA decidiu simplesmente não decidir.

Lutas entre dois blocos

A instituição continental poderia ter realizado uma votação aberta sobre o estatuto de observador de Israel: dois terços dos países teriam votado a favor. Mas a África do Sul, um parceiro económico do Estado judaico e historicamente oposto à sua presença na UA, tinha ameaçado calmamente suspender o seu financiamento institucional em 2022. “Isto demonstra como as minorias influentes podem silenciar uma maioria menos poderosa”, conclui Paul-Simon Handy.

O caso ilustra, no fundo, a luta entre dois blocos concorrentes, em particular a rivalidade entre a Argélia e Marrocos. O reino de Marrocos, que assinou recentemente um acordo de cooperação em matéria de segurança com Israel, é um dos ponta de lança desse Estado no continente, tal como o Ruanda e o Uganda.

 

Do outro lado está a Argélia, um feroz apoiante dos palestinianos, que tem rejeitado historicamente qualquer normalização com Israel. O Ministro dos Negócios Estrangeiros argelino, Ramtane Lamamra, afirmou em 2022 que a acreditação de Telavive poderia conduzir a “uma divisão profunda entre os estados-membros” da UA.

A polémica sobre o estatuto de Israel não é o único pomo de discórdia entre Rabat e Argel no seio da instituição. Recentemente, os dois países do Magreb têm lutado nos bastidores pela primeira vice-presidência da Assembleia da UA, uma responsabilidade estratégica que normalmente leva à presidência rotativa da organização continental no ano seguinte.

Israel poderá enfrentar dificuldades no próximo ano para fundamentar a sua argumentação. As Comores, a nova presidência actual da UA, é apoiante da Palestina. Em 2021, Moroni opôs-se à concessão do estatuto de observador ao Estado judeu.

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