Guterres crítica fortemente a organização que preside na abertura da 78ª Sessão da AG
O Secretário-Geral da ONU, o português António Guterres, teceu esta terça-feira fortes críticas à governação global “presa no tempo”, dando como exemplo o próprio Conselho de Segurança das Nações Unidas e as instituições financeiras de Bretton Woods.
No seu discurso de abertura do Debate da 78.ª sessão da Assembleia Geral da ONU (UNGA 78, sigla em inglês), Guterres sublinhou que esses dois sistemas refletem as realidades políticas e económicas de 1945, quando muitos países agora representados no plenário da ONU ainda estavam sob domínio colonial.
“O mundo mudou. As nossas instituições não. Não podemos resolver eficazmente os problemas tais como eles são se as instituições não refletirem o mundo tal como ele é. Em vez de resolverem problemas, correm o risco de se tornarem parte do problema”, na afirmou Guterres, que se tem posicionado como um forte defensor de reformas das instituições financeiras internacionais e do Conselho de Segurança da ONU, apelando hoje ao seu alargamento à União Africana.
De acordo com o ex-primeiro-ministro português, um mundo multipolar necessita de instituições multilaterais fortes e eficazes, e não de uma governação presa no tempo.
Chegou a hora, disse Guterres, de se renovar as instituições multilaterais com base nas realidades económicas e políticas do século XXI — enraizadas na equidade, na solidariedade e na universalidade e ancoradas nos princípios da Carta das Nações Unidas e no direito internacional.
“Isso significa reformar o Conselho de Segurança de acordo com o mundo de hoje. Significa redesenhar a arquitetura financeira internacional para que se torne verdadeiramente universal e sirva como uma rede de segurança global para os países em desenvolvimento em dificuldades”, defendeu.
O chefe das disse não ter “ilusões” de que as “reformas são uma questão de poder”, existindo “muitos interesses conflitantes e agendas” que esbarram com a necessidade de mudança.
Depois, como exemplo das desigualdades que grassam pelo mundo, mencionou a tragédia que se abateu sobre a cidade de Derna, na Líbia. “Há apenas nove dias, muitos dos desafios do mundo fundiram-se numa terrível paisagem infernal. Milhares de pessoas em Derna perderam a vida em inundações épicas e sem precedentes. Elas foram vítimas muitas vezes: vítimas de anos de conflito, do caos climático, vítimas de líderes – próximos e distantes – que não conseguiram encontrar um caminho para a paz”, afirmou. “O povo de Derna viveu e morreu no epicentro dessa indiferença – enquanto os céus libertavam 100 vezes a precipitação mensal em 24 horas, enquanto as barragens se rompiam após anos de guerra e negligência, enquanto tudo o que conheciam era varrido do mapa. Mesmo agora, enquanto falamos, corpos chegam à costa do mesmo mar Mediterrâneo onde bilionários tomam banhos de sol nos seus super iates”, criticou.
Segundo as autoridades líbias, terão morrido 11.300 pessoas e outras 10.000 estão desaparecidas, havendo ainda estimativas de que o número de mortos possa chegar aos 20.000.
O debate de alto nível da 78.ª sessão da Assembleia Geral da ONU arrancou hoje, dia 19 Setembro, em Nova Iorque, com a presença de dezenas de chefes de Estado e de Governo de todo o mundo, e irá prolongar-se até ao próximo dia 26.