
Ex-senhor da guerra desmente fuga da prisão
O antigo senhor da guerra sudanês, Ahmed Haroun, procurado por alegados crimes contra a humanidade, afirmou, na manhã de hoje, 4ºfeira, dia 26, que ele e outros detidos se encontram num lugar seguro, esclarecendo dúvidas sobre relatos que circulavam acerca da sua fuga da prisão.
No início desta semana, surgiram relatos de uma fuga da prisão de Kober – onde Ahmed Haroun estava a cumprir uma pena ao lado de Omar al-Bashir, antigo presidente do Sudão. No entanto, ontem, terça-feira, Haroun confirmou, numa declaração transmitida pela Tayba TV do Sudão, que ele e outros elementos leais a Bashir que serviram sob o seu comando, tinham deixado a prisão, contudo, adiantou que estaria pronto para comparecer perante o sistema judicial quando este estivesse a funcionar.
Numa mensagem áudio posta a circular nas redes sociais, Haroun afirma que o grupo tinha sido ajudado na sua fuga pelos guardas prisionais e pelas forças armadas. “Tomámos a decisão de nos protegermos devido à falta de segurança, água, comida e tratamento, bem como à morte de muitos prisioneiros em Kober”, disse Haroun ao al-Sudani, um jornal diário com ligações a Bashir.
Haroun foi um dos principais responsáveis pela resposta brutal do governo sudanês a duas guerras civis de longa duração e ainda por resolver no Darfur (desde 2003) e no Cordofão do Sul (desde 2011). Em 2007, foi acusado pelo TPI pelo seu alegado papel nas atrocidades cometidas em Darfur – descritas como o primeiro genocídio do século XXI – quando era Ministro do Interior do país. Sobre ele pesam 20 crimes contra a humanidade e 22 crimes de guerra, incluindo assassínio, violação, perseguição e tortura, mas ele nega as acusações.
Mukesh Kapila, antigo coordenador da ONU para o Sudão, descreveu Haroun como um homem “extremamente perigoso” e “pouco fiável”, acrescentando que tinha “muitos seguidores que têm estado à espreita nas últimas duas décadas. São realmente más notícias”, adiantou ao programa Newshour do Serviço Mundial da BBC.
Haroun foi preso em 2019, depois de o líder veterano Bashir ter sido deposto pelos militares no meio de intensos protestos populares. Desde então, o país tem registado frequentes distúrbios e várias outras tentativas de golpe de Estado.
Bashir – que tem 79 anos – estava a cumprir uma pena de prisão por corrupção. Encontra-se num hospital militar sob custódia policial, tendo sido transferido para lá antes do início das últimas hostilidades, de acordo com o exército sudanês. É também acusado pelo TPI de liderar uma campanha de assassínios e violações em massa na região sudanesa de Darfur, facto que nega também.
Entretanto, o Ministério do Interior do Sudão acusou os paramilitares rebeldes das Forças de Actuação Rápida (FAR) de ter entrado em cinco prisões nos últimos dias, incluindo Kober, que Bashir já tinha abandonado. A polícia afirmou que o ataque levou à morte de vários funcionários da prisão e que as FAR libertaram todos os que estavam detidos. Os rebeldes negam as estas acusações, afirmando que os militares “evacuaram à força” as instalações como parte de um plano para restaurar Bashir no poder.
O cessar-fogo no Sudão permitiu a vários países evacuar os seus cidadãos do país. Vários voos de evacuação que transportavam cidadãos britânicos do Sudão aterraram em Chipre, enquanto um navio que evacuou mais de 1600 pessoas de dezenas de países chegou ontem à Arábia Saudita.
Volker Perthes, o enviado especial da ONU para o Sudão e actualmente no país, disse na terça-feira que a pausa de 72 horas nos combates parecia estar a manter-se. Mas continuam a registar-se disparos e explosões esporádicas em Cartum e na cidade vizinha de Omdurman.
“Ainda não há sinais inequívocos de que qualquer das partes esteja disposta a negociar seriamente, o que sugere que ambas pensam que é possível obter uma vitória militar sobre a outra”, afirmou Perthes.
O cessar-fogo, que começou à meia-noite local (22:00 GMT) de segunda-feira, é a mais recente tentativa de trazer estabilidade ao país depois de os combates terem começado há quase duas semanas.
Até agora, pelo menos 459 pessoas morreram neste conflito, embora se pense que o número real seja muito mais elevado. Entretanto milhares de pessoas já abandonaram o Sudão e as Nações Unidas alertaram para o facto de ser provável que esta situação se mantenha, nas próximas semanas. Há também preocupação com os que ficaram para trás, com cerca de 24.000 mulheres grávidas que se encontram actualmente em Cartum e que deverão dar à luz nas próximas semanas.
Perthes disse também que muitas casas, hospitais e outras instalações públicas tinham sido danificadas ou destruídas em áreas residenciais perto do quartel-general do exército e do aeroporto de Cartum durante os combates.